Moeda digital que permitirá o fracionamento de projetos climáticos ligados ao mercado de carbono
A AirCarbon Exchange (ACX) Brasil, bolsa de ativos ambientais parceira da B3, anunciou uma moeda digital que permitirá o fracionamento de projetos climáticos ligados ao mercado de carbono. O intuito do mecanismo, divulgado durante a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), é destravar a liquidez e diminuir em um setor com investimentos de grande porte e longa duração.
A moeda digital permitirá acelerar a liquidez de uma parte dos créditos envolvidos em projetos de carbono, ao fracionar um contrato de compra futura e permitir uma captação distribuída dos recursos provenientes da redução de emissões.
“O ciclo de vida do projeto implica preços diferentes para o ativo ao longo do tempo. O quão mais próximo da conclusão do projeto, mais ele vai valer”, explica Juliana Damasceno, gerente de Relações Institucionais da ACX Brasil, ao Valor.
Ou seja, a moeda digital fará o fracionamento e formação de curvas a termo de projetos climáticos de longo prazo. Dessa forma, o mercado poderá comprar algo semelhante a ‘cotas’ de projetos de compensação de carbono. “A ideia é destravar os investimentos em projetos de grande escala e mitigação”.
Embora o foco do projeto seja inicialmente em alta integridade de créditos carbono — aqueles que garantem a redução ou remoção de gases de efeito estufa —, Damasceno explica que a ferramenta poderá ser utilizada em outros investimentos que necessitem de um destravamento de financiamento similar ao de contratos de longa duração.
Mesmo que o mercado de carbono passe por um período de baixa atratividade, em vista da dificuldade de quantificar de forma precisa a compensação de emissões e a qualidade dos ativos, há um movimento de instituições como a B3 e a ACX de antecipar a recuperação e regulação do setor.
Segundo Damasceno, a moeda digital reflete uma demanda do mercado por maior segurança e liquidez em projetos do mercado de carbono, antes da conclusão do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), projetado para 2030. A ACX também salienta que o novo mecanismo contribuirá para que o Brasil avance no cumprimento das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs).
O crédito de carbono tem sido um dos temas mais criticados pela sociedade civil e por ambientalistas durante a COP30. Um relatório do Climate Action Tracker aponta que as metas e ações climáticas apresentadas pelos países até 2035 – as NDCs – “não estão fazendo diferença” nas projeções globais, em vista da saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris e da falta de metas mais ambiciosas por outras nações.
A comunidade científica também tem questionado a efetividade do mercado de carbono na busca por emissões neutras. Um estudo das Universidades de Oxford e da Pensilvânia, divulgado semanas antes do início da COP30, indicava que os programas de compensação de carbono superestimaram o provável impacto climático, frequentemente por um fator de cinco a dez ou mais.
A despeito dos evidentes desafios no setor, Damasceno explica que o mercado de carbono é uma ferramenta de transição no processo de descarbonização. “Dado que nós não podemos acordar amanhã com todas as tecnologias para emitir menos, esse mecanismo de mercado viabiliza uma solução mais custo-eficiente”.
Damasceno reconhece a necessidade de investir em novas ferramentas e na ciência para acelerar o processo de descarbonização, mas afirma que, no meio do caminho, é mais eficiente para setores com maiores emissões precificar o carbono através do crédito. “Uma vez que você constrói esse ambiente robusto, você cria condições de um mercado mais crível globalmente”, diz.
Publicado originalmente no Valor Econômico

